O Espetacular Homem-Aranha (The Amazing Spider-Man, 2012) de Marc Webb
De projeto encalhado nos anos 90 à sua produção final, a primeira adaptação dos HQs de Homem-Aranha demorou pouco mais de 10 anos. Em meados dos anos 2000, cultuado Sam Raimi assumiu a obra e, finalmente, em 2002 Homem-Aranha, o filme, chegou às telas de cinema. Sucesso fenomenal de público, a obra envelheceu mal (principalmente os efeitos especiais), mesmo com o atestado de grande divertimento. Contou a origem do herói de forma colorida e com algumas pontas soltas. Ah, e o Duende Verde parecia vilão do Jaspion ou algum congênere.
Já Homem-Aranha 2 (2004) foi um acerto assombroso, mais sombrio e com um vilão sensacional (Octopus). Sim, outro grande sucesso de bilheteria. Sam Raimi e toda sua trupe já haviam assinado para um terceiro capítulo, o que não tardou a acontecer. Mas com muitos problemas, Homem-Aranha 3 (2007) foi um desastre artístico. Ainda assim a patética obra rendeu horrores. E a Sony, detentora dos direitos do personagem de Stan Lee e Steve Dikto, queria mais. Nada mais natural depois de mais de 2,5 bilhões de dólares arrecadados somente nos cinemas. Mas Sam Raimi, equipe técnica e protagonistas, Tobey Maguire e Kirsten Dunst estavam fora. Decisão da Sony: reiniciar a história do zero, agora sem pontas soltas.
Em tese, o primeiro longa deve sofrer mais as comparações, por conta da origem do herói. E, sim, em O Espetacular Homem-Aranha (The Amazing Spider-Man, 2012) de Marc Webb, existem vários fatos refeitos e uma origem recontada. Mas de uma maneira arrebatadora.
Do plot original, a adaptação de HQs do cabeça de teia tem uma trama que nos mostra um órfão (Andrew Garfield) que vai morar com os tios (o ótimo Martin Sheen e uma Sally Field, com uma cara de choro sem fim) adquire superpoderes após ser picado por uma aranha geneticamente modificada e se transforma involuntariamente num herói. Até aí nada de novo, mas temos novidades.
Sai Mary Jane e entra a seu primeiro amor dos HQs, Gwen Stacy (Emma Stone). A personalidade de Peter Parker também é outra, Antes um nerd bobão, agora é um gênio dos números, fórmulas e inventor de algumas engenhocas. As teias, outrora produzidas organicamente, agora voltam ao conceito original e são lançadas através de um lança teia. Sua descoberta dos poderes se dá em meio ao metrô, numa ótima sequência de assalto e reação. E seu próprio treinamento que envolve correntes e skate é mais real do que qualquer brincadeira feita por Sam Raimi em 2002. Afinal a palavra de ordem desse novo longa é realismo. Nosso herói agora é sujo, apanha muito, sangra. Mas também bate que é uma beleza.
A dor da perda pessoal de Peter Parker é bem explorada ao extrair delas sua principal motivação de, primeiro de tornar um vigilante (ou seria vingador), para depois cair nas graças do público e se tornar o herói, Homem-Aranha. Aqui não há a frase clássica de “grandes poderes trazem grandes responsabilidades”, mas sua mudança, também calcada na visível humanização do personagem, é de adolescente para homem com tremendo peso nas costas.
O confronto contra o chefe de polícia (Denis Leary, muito bem) é bem utilizado numa discussão à mesa de jantar, local e ocasião clássicos para os americanos. E Emma Stone faz uma Gwen Stacy parecer bem crível. Alías, sua química com Garfield é demais. Grafield tem nuances bens construídos (e divertidos), como um sorriso de brincadeira, a batida na janela com a cabeça e o (não) diálogo em que os dois se entregam ao romance (que passou para o real após as filmagens). E de romance, Marc Webb entende, vide sua estreia na direção, (500) Dias Com Ela (2009).
A trama versa ainda uma história muito maior por trás da morte dos seus pais, ligados diretamente à Oscorp, empresa o qual seu proprietário se transformará no Duende Verde. E falando em vilão, o escolhido para iniciar mais aqui a franquia é o Dr. Curt Connors (Rhys Ifans, digno até em perder as estribeiras), que depois se transforma no Lagarto. Por motivos bem plantados e orquestrados, com ótimas possibilidades até para novos capítulos (em cenas durante os créditos finais). Que, claro, acontecerá. E já tem até data marcada: 2 de maio de 2014.
No quesito técnico, a superprodução erra quase nada. A trilha de James Horner insiste muito no emocional, mas não enjoa. Para um longa de duas horas e 16 minutos a edição tem poucos percalços e só perde algum ritmo no terço final, entre um confronto e outro. Já a fotografia, quase sempre azul, fortalece o tom pesado. Seus efeitos especiais incríveis, demonstrado em sequências de arrepiar, como no resgate na ponte, o confronto nos esgotos, a busca sem fim por um certo assassino e a maravilhosa cena final na torre. Filmado em 3D, Marc Webb demora um pouco para engrenar, mas faz o efeito valer a penas ao investir nas cenas subjetivas para explorar bem o tridimensional, além do (bom) uso do lança-teia.
O final força um pouco em cima do clichê que “a união faz a força”, bem americanizado, mas passa por cima dos excessos ao apresentar um nova (velha) história de forma divertida e muito eficaz. É um filmão, pipocaço sim, mas muito, muito envolvente e bem pavimentado de drama, romance e muita ação. Sim, O Espetacular Homem-Aranha é espetacular. Mesmo. PS.: A aparição de Stan Lee é hilariante. NOTA: 9,0
INFORMAÇÕES ESPECIAIS:
Andrew Garfield indicado ao Globo de Ouro de coadjuvante por A Rede Social (2010);
Emma Stone indicada ao Globo de Ouro de atriz (comédia/musical) por A Mentira (2010);
Rhys Ifans indicado ao BAFTA de coadjuvante por Um Lugar Chamado Notting Hill (1999); Denis Leary indicado ao Globo de Ouro de coadjuvante por Recontagem (2008) mini-série ou filme para TV;
Martin Sheen venceu o Globo de Ouro de ator de série de TV (drama) por West Wing (1999~2006);
Sally Field venceu o Oscar e o Globo de Ouro de atriz por Um Lugar no Coração (1984) e Norma Rae (1979), pelo qual ganhou também o prêmio de melhor atriz em Cannes;
Filmografia selecionada dos roteiristas: James Vanderbilt escreveu Violação de Conduta (2003); Zodíaco (2007); Os Perdedores (2010); Alvin Sargent venceu o Oscar de roteiro adaptado por Gente Como a Gente (1980) e Júlia (1977); escreveu também Loucos de Paixão (1990); Nosso Querido Bob (1991); Herói por Acidente (1992); Infidelidade (2002); Homem-Aranha 2 (2004); Steve Kloves indicado ao Oscar e Globo de Ouro de roteiro adaptado por Garotos Incríveis (2001); escreveu também Susie e os Baker Boys (1989) e Adeus a Inocência (1984);